Nada faz sentido sem você




Sinto sua falta até hoje e isso dilacera meu coração. Às vezes - muitas - eu paro o mundo e penso em nós.

N
o fim do dia, abro a porta do mesmo apartamento que rimos e choramos juntos, tiro meus sapatos, desabotoo o sutiã e vou até a geladeira pegar uma daquelas garrafas de budweiser que compramos juntos para os melhores e os piores dias. Nós decidimos que viveríamos tudo juntos, como grandes amigos devem fazer.

Vou tirando a roupa pela casa e, ao chegar no quarto e vê-lo arrumado e limpo, sinto um vazio no meu coração. Me sento ali, no chão daquela limpeza doentia, e me lembro de como éramos bagunceiros ao pedirmos comida e ao derramar, aos risos, nossas bebidas no meu tapete.  Ríamos dos outros, ríamos das nossas próprias desgraças, éramos os melhores críticos de séries que o mundo jamais conheceu.

Com uma lágrima nos olhos, me lembro de como não faz sentido você ter jogado tudo isso fora, como se nós fóssemos pedaços de papel ao sermos amassados e jogados no lixo. No meu lixo.

Com a segunda garrafa na pia do banheiro e lágrimas escorrendo no chuveiro, sinto sua falta como sinto de respirar quando perco o ar em crises de choro como esta. Eu me lembro de tudo, mesmo que já faça muito tempo, me lembro dos pequenos detalhes, de como só a sua voz conseguia me acalmar.

Pode ser que eu tenha pedido demais, quando implorei para que você ficasse e resolvéssemos nossas diferenças. Talvez você tenha me magoado demais e, mesmo tentando me desculpar, o que era fácil, ficou confuso. E enquanto meu orgulho se ergue sobre mim, ele nunca se ergueu sobre nós, mas o seu orgulho foi, e ainda é, maior que nós.

Se eu pudesse fazer algo para repararmos nossos erros, eu sei que faria sem pensar duas vezes, mas você nunca me deu essa chance, nunca me disse onde erramos e quando ficou difícil demais para suportar. Agora, um pouco mais calma do choro convulsivo, depois de um tempo debaixo da água quente, sigo meu novo ritual sem você.

Agora eu tomo chá. Eliminei o café, dei aos amigos as garrafas de vinho, acabei com a última cerveja e não pretendo comprar outras. Não faz sentido sem você. Nada faz. Nada além do chá e das comidas saudáveis. Parei de pedir comida também, porque tem suas marcas e me magoa como todas as outras coisas que construímos juntos. Não sei o que eu disse para que você saísse correndo feito um garoto assustado.

Com meu roupão branco, só ouço o silêncio que me corta como uma navalha. Pensei que sabia para onde estávamos indo, mas você colocou um ponto final no lugar de uma vírgula e, quando o chá acabar, vou dormir naquele segundo quarto de depência de empregada, porque o meu quarto não faz sentido sem você. Nada faz.

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