A verdadeira arma contra o suicídio
A verdadeira arma contra o suicídio,
Por Fernanda Campos,
Psicóloga formada pela Universidade Federal de São João Del-Rei
Por Fernanda Campos,
Psicóloga formada pela Universidade Federal de São João Del-Rei
O Setembro Amarelo acabou. A importância de falar sobre o suicídio não.
O tema polêmico gera discussão quase sempre que aparece, muitas vezes porque é tratado de maneira displicente, apesar de tantas diretrizes dos órgãos responsáveis. O medo de falar sobre o assunto deriva de um “surto de suicídio” após a publicação do livro “Os sofrimentos do jovem Werther”, no século 19, em que o final trágico explícito gerou mortes em massa entre os leitores. Foi a partir daí que o tema virou tabu – e todo mundo começou a acreditar que expor seria incentivar o ato.
Não falar não resolve os problemas, também.Em tempos complicados, onde há muito discurso em favor de armamento, é necessário expor as mazelas de uma sociedade que esconde os suicídios debaixo do tapete. Quanto mais fácil o acesso a venenos e armas, mais fácil se pode dar fim numa ideação. O armamento não é uma questão de segurança. É uma questão de ameaça.
Transtornos psicológicos são silenciosos. Você provavelmente conhece alguém que passa por episódios de depressão, de ansiedade, de boderline, de TOC, enfim. Você provavelmente nunca percebeu. Não tem idade, não tem sexo, não tem classe social. Crianças e adolescentes são vítimas tanto quanto adultos universitários e idosos aposentados. Em um lugar em que o acesso a formas de se matar é facilitado – seja ele qual for – as chances de o suicídio acontecer antes da pessoa ter a chance de procurar ajuda (o CVV – Como Vai Você, por exemplo, acessível a um clique na internet ou a uma discagem do 188) pode causar um suicídio em massa muito mais do que a literatura proibida no século 19. Basta ver a história do primeiro transplante facial, após a tentativa de suicídio da jovem com a arma dos pais (ver aqui https://www.nationalgeographic.com/magazine/2018/09/face-transplant-katie-stubblefield-story-identity-surgery-science/, caso não conheça a história).
Saúde mental é coisa séria. E precisa ser exposta. Num país em que as tentativas de suicídio crescem assustadoramente, ao mesmo tempo que o preconceito em relação aos tratamentos psiquiátricos e psicológicos não diminuem, campanhas como Setembro Amarelo deveriam durar o ano inteiro. Não para você abrir seu inbox na rede social, sem nenhum preparo para ouvir o outro em sua pior dor, porque isso é irresponsabilidade e não deveria ser incentivado – empatia todo mundo pode ter, mas ouvir o outro é mais do que dizer “eu compreendo”, é realmente compreender que aquele mundo não é seu e que aquela dor pode, sim, ser um gatilho para sentimentos, sensações e reações que você, enquanto não profissional, não está pronto para lidar – mas para saber que tipo de política pública deveríamos apoiar, em tempos tão sombrios.
Não é um texto sobre política, mas quando se fala de saúde mental, necessariamente, deve-se falar de medidas políticas porque envolve saúde pública e cuidado a longo prazo. É importante nos atentar para os pequenos sinais que nossos companheiros, amigos, familiares e a gente mesmo dá, para sabermos avaliar a que pé anda nosso psicológico. Mas é mais importante saber que é no silêncio que os sofrimentos se manifestam. E que com facilidade de acesso a formas de acabar com a dor pode ser o último grito que não dará tempo para ninguém escutar.
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